Fechado, Hospital Espanhol mantém estrutura antes de ser leiloado

“Parece que todo mundo saiu correndo”. É como o atual guardião das chaves do Hospital Espanhol, Francisco Souto Perez, o Paco, tenta descrever a situação da unidade médica que fica num dos pontos privilegiados da orla da Barra.

Há pouco mais de dois anos, o Espanhol fechou as portas e interrompeu o funcionamento por conta de dívidas. Mas parece que tudo foi deixado lá como se, no dia seguinte, os funcionários e pacientes fossem voltar e retomar a rotina de trabalho e atendimentos.

Ao entrar no imóvel, dá para entender o que Paco quis dizer: parece um hospital fantasma. Desde que parou de funcionar, em setembro de 2014, pouca coisa foi retirada. Até o lixo, alguns resíduos tóxicos e material de descarte ficaram por lá.  No lixo comum, sacos plásticos, papéis e copos descartáveis predominam.

“Tem caneta por cima da mesa, tudo está do jeito que foi deixado”, explica Paco, enquanto guia a reportagem do CORREIO no local junto com o leiloeiro Rudival Júnior. Ele é um dos credenciados pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT5) para a alienação do hospital, que será leiloado no próximo dia 8 de maio, em Salvador, com lance mínimo de R$ 195,3 milhões – para pagar um débito trabalhista de R$ 130 milhões.

Tudo a postos
A sensação de quem circula pelo prédio é de que o hospital parou no tempo. Tudo está pronto para ser usado, só faltam os pacientes e os profissionais. Na sala de emergência, ventiladores mecânicos esterilizados permanecem dentro de sacos, prontos para serem usados para salvar vidas, assim como coletores.

Na mesa da equipe administrativa, há bloquinhos de receituário, de atestado e até uma pasta com a escala dos funcionários. Sobre as macas, está escrito num quadro branco: “Nome, DN e alergia”.

“Às vezes, eu entro aí e eu choro. Um hospital que já chegou a faturar R$ 18 milhões…”, lamenta Paco. Para ele, as lembranças de ver o hospital a todo vapor  são  fortes, já que trabalhou lá por 27 anos. Dono de uma empresa de refrigeração, fazia a manutenção dos sistemas de ar-condicionado. Hoje, ele e o sócio, Eugênio Melo, cuidam do prédio fechado.

A possibilidade de o Espanhol voltar a operar faz brilhar os olhos dos “cuidadores” do complexo. “Esse é o objetivo de a gente estar aqui”, fala Eugênio. “Eu quero que funcione, mesmo que eu não receba meu dinheiro”, conta Paco, que como fornecedor  tem  R$ 700 mil a ser quitado.

Vazio
Lá dentro, o que denuncia o abandono é a ausência de gente, além do cheiro de poeira e do mofo que mancha as cadeiras. A maioria está rasgada ou quebrada. No mais, quase tudo está em bom estado: os equipamentos de tomografia, de raio-X, as macas e os colchões onde os pacientes deitavam.

Em alguns aparelhos, surgem os primeiros indícios de ferrugem nas bases, perto das rodas para transportes. “O risco é que depois de tanto tempo sem uso, alguns equipamentos se deteriorem e parem de funcionar. Uns permanecem ligados, para evitar que estraguem”, explica Eugênio.

Um dos suportes de soro da emergência, por exemplo, apita sem parar, indicando que mais uma bolsa seja colocada para um paciente. Além dos dois prédios, vários desses equipamentos também serão leiloados. Segundo o TRT5, são 281 itens, avaliados, ao todo, em R$ 9.922.400.

Na entrada do Centro de Terapia Intensiva (CTI), há um folheto falando da importância de cuidar da saúde bucal dos pacientes internados na unidade, além de cadeiras mofadas e rasgadas na sala de espera. Dentro, em um dos leitos, uma infiltração estragou o teto; em outro, ainda há uma plaquinha indicando que um paciente tem que estar em dieta zero. Em um dos suportes para prontuário, consta a indicação de fisioterapia para um dos internados.

Efeito do tempo
Quanto mais se sobe as escadas do prédio principal, mais  se percebe os efeitos do tempo no Hospital Espanhol. De fato, o prédio tem problemas com infiltração, principalmente nos andares superiores. No sétimo andar, por exemplo, uma bolha de água se formou por causa da água da chuva e a pintura pode romper a qualquer momento. Em outro andar, um pedaço do gesso do teto caiu, deixando à mostra a fiação elétrica.

O setor mais novo do Hospital, a UTI Neonatal, havia sido reinaugurado menos de seis meses antes do fechamento. Lá, 12 incubadoras quase novas. Algumas nem chegaram a ser utilizadas, segundo o diretor da Coordenadoria de Execução e Expropriação do Tribunal de Justiça da 5ª Região, Rogério Fagundes. Cabos para aparelhos, respiradores, caixas de pomadas para assadura em bebês, tudo está do mesmo jeito.

O Centro Diagnóstico de Imagem (CDI), em um dos blocos do prédio principal do hospital é o que está em pior estado. O cheiro de mofo é insuportável, as aduelas das portas começaram a desfazer e em todo lugar há infiltração.

E é justamente onde estão alguns dos equipamentos mais caros: dois tomógrafos importados da Alemanha. “Na época, custaram R$ 3,5 milhões. Era o que tinha de mais moderno. Os funcionários foram para a Alemanha para serem treinados”, conta Fagundes. Lá também está um aparelho para cirurgia robótica, equipamentos de tomografia e ultrassonografia.

O corredor que leva à administração, onde fica a lavanderia e o almoxarifado, também dá pena de se ver. Tudo está sujo e tomado pela umidade. O caminho para lá está coberto pelas folhas e o mato toma conta das paredes.

*Correio 24hrs.



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