O governo de Cuba informou nesta quarta-feira (14) que decidiu sair do programa social Mais Médicos, citando “referências diretas, depreciativas e ameaçadoras” feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro à presença dos médicos cubanos no Brasil. O país caribenho envia profissionais para atuar no Sistema Único de Saúde desde 2013, quando o governo da então presidente Dilma Rousseff criou o programa para atender regiões carentes sem cobertura médica.
O comunicado não diz a data em que os médicos cubanos deixarão de trabalhar no programa. A Opas disse apenas que foi comunicada da decisão, sem dar mais detalhes.
Expulsão pelo Revalida
Em agosto, ainda em campanha, Bolsonaro declarou que ele “expulsaria” os médicos cubanos do Brasil com base no exame de revalidação de diploma de médicos formados no exterior, o Revalida. A promessa também estava em seu plano de governo.
Fora do Mais Médicos, os formados no exterior não podem atuar na medicina brasileira sem a aprovação no Revalida. Mas no caso do programa federal, todos os estrangeiros participantes têm autorização de atuar no Brasil mesmo sem ter se submetido ao exame.
“Qualquer estrangeiro vindo trabalhar aqui na área de medicina tem que aplicar o Revalida. Se você for para qualquer país do mundo, também. Nós não podemos botar gente de Cuba aqui sem o mínimo de comprovação de que eles realmente saibam o exercício da profissão. Você não pode, só porque o pobre que é atendido por eles, botar pessoas que talvez não tenham qualificação para tal”, justificou.
Em novembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) validou o Mais Médicos e autorizou a dispensa da validação de diploma de estrangeiros ao julgar ações que questionavam pontos do programa federal, como acordo que paga salários mais baixos para médicos cubanos.
A atuação dos médicos cubanos no Brasil gera polêmica desde a criação do Mais Médicos. No entanto, o programa contrata profissionais de várias nacionalidades, e não apenas cubanos.
No Mais Médicos, pouco mais da metade – 8.556 dos 16.707 participantes – vêm de Cuba, de acordo com o G1. Todos os profissionais, independentemente do país de origem, precisam ter diploma de medicina expedido por instituição de ensino superior estrangeira, habilitação para o exercício da profissão no país de origem e ter conhecimento de língua portuguesa, regras de organização do SUS e de protocolos e diretrizes clínicas de atenção básica.
Veja pontos do programa Mais Médicos
- Foi criado em julho de 2013 para ampliar o atendimento médico principalmente em regiões mais carentes.
- Em agosto de 2013, fechado acordo com a Opas para participação de médicos cubanos.
- Participação de brasileiros formados no Brasil aumentou 38% entre 2016 e 2017, de acordo com o Ministério da Saúde.
- Programa tem 18.240 vagas em mais de 4 mil municípios e 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI).
- Atende cerca de 63 milhões de brasileiros, de acordo com o Ministério da Saúde.
- Participação de cubanos no programa tinha sido renovada no início deste ano por mais cinco anos.
- Levantamento do governo divulgado em 2016 apontou que o programa é responsável por 48% das equipes de Atenção Básica em municípios com até 10 mil habitantes.
- Em 1.100 municípios atendido pelo programa, o Mais Médicos representava 100% da cobertura de Atenção Básica, de acordo com dados divulgados em 2016.
Veja abaixo a íntegra da nota, publicada no jornal “Granma”:
“Declaração do Ministério da Saúde Pública
O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, com referências diretas, depreciativas e ameaçadoras à presença de nossos médicos, declarou e reiterou que modificará os termos e condições do Programa Mais Médicos, desrespeitando a Organização Panamericana de Saúde.
O Ministério da Saúde Pública da República de Cuba, comprometido com os princípios solidários e humanistas que durante os 55 anos guiaram a cooperação médica cubana, participa desde o inicio de agosto de 2013 no Programa Mais Médicos para o Brasil. A iniciativa Dilma Rousseff, na época presidente da República Federativa do Brasil, teve o nobre propósito de garantir assistência médica para o maior número da população brasileira, em consonância com o princípio da cobertura universal de saúde promovida pela Organização Mundial da Saúde.
Esse programa previa a presença de médicos brasileiros e estrangeiros para atuar em áreas pobres e remotas daquele país.
A participação cubana no mesmo é feita através da Organização Pan-Americana da Saúde e se distinguiu pela ocupação de lugares não cobertos por médicos brasileiros ou de outras nacionalidades.
Nestes cinco anos de trabalho, cerca de 20 mil colaboradores cubanos atenderam 113.359.000 pacientes em mais de 3.600 municípios, chegando a cobrir um universo de 60 milhões de brasileiros na época em que constituíram 80% de todos os médicos participantes do programa. Mais de 700 municípios tiveram um médico pela primeira vez na história.
O trabalho dos médicos cubanos em locais de extrema pobreza nas favelas do Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador de Bahia, nos 34 Distritos Especiais Indígenas, especialmente na Amazônia, foi amplamente reconhecido pelos governos federal, estaduais e municipais daquele país e de sua população, que lhe concedeu 95% de aceitação, segundo estudo encomendado pelo Ministério da Saúde do Brasil à Universidade Federal de Minas Gerais.