‘Querem me prender, me prendam, eu estou cansado’, diz dono da Kiss

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“Querem me prender, me prendam, eu estou cansado, cara. Eu sei que perderam gente e tal, mas perdi um monte de amigos, eu perdi funcionários. Acham que eu não tinha amigos lá? Acham que eu ia fazer uma coisa dessas?”, disse, em choro intenso, Elissandro Spohr, um dos sócios-proprietários da Kiss, durante seu depoimento no tribunal do júri, nesta quarta-feira (8).

Spohr foi o primeiro dos quatro réus a falar no julgamento do caso. Ele, o sócio Mauro Hoffmann e os integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos (vocalista) e Luciano Bonilha Leão (assistente de palco), são acusados por homicídio e tentativa de homicídio simples por dolo eventual pelas 242 mortes ocorridas na tragédia.

“Não é fingimento! Eu não aguento mais, cara. Eu estava tremendo, eu estava sem ar. Eu tive que pegar ar para dar esse depoimento”, disse ele, ainda chorando.

Devido ao quadro emocional do réu, o juiz Orlando Faccini Neto parou a sessão para um intervalo de quarenta minutos.
Spohr contou que estava resolvendo um problema com uma pessoa, do lado de fora da boate, quando foi informado que havia uma situação no palco por um funcionário e descreveu como agiu depois de se dar conta que havia um incêndio.

O ex-dono da Kiss, apontado em depoimentos como a pessoa responsável por tomar as decisões na boate, disse que estava tentando ajudar no estabelecimento e a tirar pessoas do local, levando para o estacionamento do supermercado Carrefour, em frente, quando viu uma ex-funcionária chamada Vanessa se aproximar.

Spohr afirmou que estava de braços abertos e pensou que receberia um abraço dela, mas foi surpreendido por um tapa. A jovem perguntava a ele pela irmã, que trabalhava no local e morreu na tragédia.

Depois disso, segundo ele, disseram que seria melhor que ele saísse do local porque poderia ser agredido. Spohr disse ter ido então para uma delegacia, para que constasse que se apresentou, que estava morrendo gente na sua boate e que ele não sabia o que fazer. Quando ouviu que os mortos estavam em torno de 30 pessoas, ele vomitou. Mas, enquanto acompanhava na rádio, a conta ia aumentando.

“Eu não consegui pedir desculpa. Eu ia procurar quem? Como eu ia falar com alguém? A Vanessa que trabalhou comigo, que me conhecia, foi me dar um tapa. Pessoas que eram meus amigos me mandaram mensagem mandando eu me matar. Eu ia me matar, não tem, não tinha como ficar nessa situação”, falou ainda chorando.

“Isso não devia ter acontecido, eu sei que não devia ter acontecido. Por que isso foi acontecer na Kiss, cara? Era uma boate boa, era uma boate que todo mundo gostava de trabalhar.”

Mais cedo no depoimento, questionado pelo magistrado, Spohr respondeu que a banda Gurizada Fandangueira não tinha sua autorização para usar o artefato pirotécnico no show da madrugada de 27 de janeiro de 2013. O juiz perguntou se alguma outra banda já havia pedido para usar algo do tipo na boate.

“Até o acontecido, eu não lembro”, afirmou ele. “Acho que eu não deixaria, por causa das cortinas, alguma coisa assim. Eu não sei. Não. Eu não deixaria”, respondeu por fim.

O juiz perguntou ainda se ele avisou ao grupo que a reforma diminuiu a distância entre teto e palco e que havia espuma. “Não tive essa conversa com eles e acredito que eles, realmente, achavam que esse treco não pegava fogo”, relatou.

Em depoimento na última segunda (6), Márcio de Jesus dos Santos, músico da banda, afirmou que o grupo não foi informado sobre restrições na casa. Segundo Spohr, a banda se apresentou outras vezes na Kiss, mas sua relação era mais próxima com Danilo Jaques, o responsável por fechar os trabalhos. Danilo era o gaiteiro do grupo e morreu na tragédia.

No oitavo dia, o júri pelas mortes na Kiss é o mais longo do Judiciário gaúcho. O processo foi desaforado de Santa Maria a Porto Alegre a pedido de defesas que questionaram se a cidade onde ocorreu a tragédia teria júri imparcial, já que boa parte da população foi afetada.

Além de Elissandro Spohr, outras quatro pessoas foram ouvidas nesta quarta, incluindo o promotor do Ministério Público Ricardo Lozza, responsável pelo TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) para resolver o problema da poluição sonora na boate, e o ex-prefeito Cezar Schirmer (MDB).

A ordem definida de inquisição dos demais réus será Luciano, Mauro e Marcelo.

*NM



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