Tempos modernos na corrupção eleitoral – por Waldir Santos

Waldir Santos – Advogado da União, ex-Procurador do Estado e escritor

 

Para quem não conhece a crueldade da política, por não morar em um bairro popular e nunca ter vivido em uma cidade pequena, vai aqui um exemplo atual e ilustrativo da realidade. “Muitas pessoas escutam coisas como: seja candidato, você é conhecido, competente, as pessoas confiam em você e sabem da sua capacidade de trabalho, da sua honestidade. A causa que você defende é importante e precisamos de pessoas assim na política.” E aí o camarada, sabendo que tudo isso é verdade, anuncia-se pré-candidato. Começa logo a ser procurado por “lideranças” que ele não conhece, mas que misteriosamente conhecem ele. E que lhe dizem: “olha, o apoio da nossa comunidade não envolve dinheiro. O que nós queremos é que o senhor seja eleito para trazer para a cidade as coisas que a gente precisa, emprego, asfalto, segurança.”.

Pouco tempo depois, quando o inocente se empolga, a conversa muda um pouco: “O senhor sabe que sem dinheiro o candidato não vai pra lugar nenhum, né? O senhor já viu alguém ser eleito sem dinheiro? A gente precisa de um mínimo de estrutura, e também tem que remunerar o pessoal que vai trabalhar pela sua eleição.”

Estrutura essa é a palavra que denomina o caminho pelo qual os candidatos desonestos compram o apoio de lideranças, que vendem os votos de eleitores inocentes, que, ao contrário do que se diz na imprensa e nos bares, não vão receber dentadura nem colchão.

Na Bahia, em 2018, essa tal estrutura custa, em cada município, em torno de 200 mil reais. Por aí o leitor começa a entender o quanto se rouba para ganhar uma eleição para vias tradicionais. E o tanto de gente honesta que vota em ladrão. Isso explica o fato de a quase totalidade dos eleitos terem seus votos concentrados em pacotes por zonas eleitorais. O cidadão tem 3 mil votos no Município X, mas no vizinho ele não tem um voto sequer, mesmo as cidades sendo coladas e as rádios sendo as mesmas. Isso explica por que candidato rico tem voto onde ele nunca foi e onde ninguém o conhecia antes da campanha.

O meu amigo Miguel Lucena, morador de Brasília e candidato a deputado federal, relata um caso curioso, mas comum. Uma “liderança” dos motoristas de uber pediu a ele 45 mil reais para que fossem promovidas 20 reuniões com os colegas e com moradores de Taguatinga. Nesses encontros, a ele seria permitido fazer algumas promessas, os participantes não estariam sabendo que seus votos estão sendo vendidos, e o candidato alimentaria a ilusão de que aquilo resultaria em votos, inclusive dos familiares dos motoristas. E o sistema prossegue vivo, sendo atualizado com os aplicativos.

Miguel é um brasileiro sério como poucos, um paraibano inteligente como todos, e, como jornalista, delegado de polícia e ex-advogado, bem informado. E, assim, mandou logo o espertalhão cuidar do volante.

 

*Waldir Santos – Advogado da União, ex-Procurador do Estado e escritor



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