Mais que questões jurídicas: do que o mundo é feito? – Por Aline Passos

Em outros momentos da história, epidemias, pandemias e doenças infectocontagiosas, geraram várias consequências sociais, econômicas, religiosas, afetando drasticamente diversos países, tais como a peste negra, tuberculose, varíola, gripe espanhola, AIDS, entre tantas outras que poderíamos elencar aqui.

A peste negra, por exemplo, foi uma devastadora pandemia que causou sérias repercussões para o mundo ocidental. Estima-se que tenha vitimado pelo menos 1/3 da população em geral, e a principal causa foi o contágio com a bactéria Yersinia pestis, transmitida ao ser humano através das pulgas (Xenopsylla cheopis) dos ratos-pretos (Rattus rattus).

A cólera também foi uma pandemia, causada pelo Vibrio cholerae, mais comuns em países subdesenvolvidos, em que medidas de saúde pública não são adotadas. Os pricipais fatores de ocorrência estão associado à falta de saneamento, escassez de água potável e a pobreza. As crianças são as mais atingidas. Em 1855, no momento em que o cólera-morbo chega ao Brasil, os diagnósticos proferidos pela ciência médica diante do avanço da epidemia poderiam ser resumidos em uma única informação: “Não sabemos do que o mundo é feito”, afirmação que se traduzia, nas palavras do médico pernambucano Cosme de Sá, ressaltadas no Artigo Científico de Luciana dos Santos da Universidade Federal do Pernambuco.

No mesmo sentido, foram as contaminações por varíola. Doença infectocontagiosa provocada pelo vírus Orthopoxvirus variolae, da família Poxiviridae. Ela foi erradicada mundialmente por volta dos anos 1970 após uma campanha de imunização da Organização Mundial da Saúde (OMS), tendo sido na África o registro do último caso, segundo o professor Oswaldo Paulo Forattini do Departamento de Epidemiologia Faculdade de Saúde Pública Universidade de São Paulo.

E agora o corona vírus, CONVID-19. Fato é que o momento requer cuidados especiais, e tem sido divulgado de forma abrangente pelas redes sociais e meios de comunicação. A Lei 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública, em seu artigo 3º dispões sobre as medidas a serem adotadas, tais quais o isolamento; a quarentena; e a realização compulsória de exames médicos; testes laboratoriais; coleta de amostras clínicas;  vacinação e outras medidas profiláticas; tratamentos médicos específicos; estudo ou investigação epidemiológica, entre outras.

Tal regulamentação coaduna com o direito constitucional fundamental à saúde, de obrigação de todos os entes da federação. É dever do Poder Público prover tal direito em sua integralidade. Embora tenhamos uma série de normas que garantam o direito à saúde, reconhecemos que as condições precárias de acesso ao sistema de saúde, além de que sabemos que nossas estruturas são insuficientes. E tal precariedade se estende a diversos outros serviços, como por exemplo, ao abastecimento de água. Como lavar as mãos, se ao menos existe fornecimento de água?

Segundo reportagem veiculada no Brasil 247, a Agência Nacional de Saúde (ANS) no último dia 12/03/2020 estabeleceu que os planos de saúde são obrigados a cobrir os testes para o novo coronavírus. Conforme a resolução, a cobertura é obrigatória quando o paciente se enquadrar como caso suspeito ou provável de doença pelo novo coronavírus, conforme definição do Ministério da Saúde. Será necessária a indicação médica para a realização do exame. Cumpre registrar, com base no disposto no art. 14 do CDC, que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Acrescenta-se que o acesso às informações é previsto no art. 5º, inciso XXXIII da Constituição Federal e também no Código de Defesa do Consumidor, devendo as organizações divulgar os dados de casos encontrados, as medidas tomadas, suspensão de serviços, adiamentos, etc. Enquanto cidadãos também temos o nosso dever de checar as informações veiculadas, de forma a coibir a prática das “fake news”, notícias inverídicas que viralizam num tempo recorde, com a finalidade de propagar o pânico.

Por outro lado, merece destacar que as empresas devem adotar posturas coerentes e estratégias para enfrentar esse momento, vez que trará também impactos para as atividades comerciais. O trabalho home office, e-comerce, ensino à distância, são alternativas para proteger seus colaboradores e público alvo. A preocupação também com os parceiros de negócios e fornecedores deve subsistir. O consumo de produtos de pequenos comerciantes, lanchonetes, pet shops, mercearias e demais estabelecimentos de bairros, a manutenção dos pagamentos de profissionais liberais, adiamentos de serviços ao invés de cancelamentos, também são medidas necessárias, em prol da manutenção da subsistência das pessoas e negócios.

Nesse momento enquanto advogada, professora e sobretudo cidadã percebo que Cazuza tinha razão “Eu vejo o futuro repetir o passado, Eu vejo um museu de grandes novidades, o tempo não para…”. Mais do que leis, decretos, códigos, e garantias legais, o mundo é feito de solidariedade. Quanto mais solidários formos, seremos mais fortes!!

Aline Passos
Mestra em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente, especialista, professora universitária e advogada.

 



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