Pode chamar de negro? Professor e vereador Uberdan Cardoso dá sua opinião sobre Injúria Racial X Xenofobia

Com esse imbróglio entre os jogadores de futebol “Índio” Ramires e Gérson e as acusações mútuas de Injúria Racial e Xenofobia, sobram – nos algumas lições.
O Futebol nos dá a falsa ideia de que é um esporte democrático. Nunca Foi!
O esporte da elite branca inglesa chegou ao Brasil em 1894 através de um brasileiro chamado (imagine) Charles Miller. Com uma bola e um livro de regras na bagagem, Miller desembarcou em São Paulo e o Footbal caiu nas graças dos brancos brasileiros que ainda se dividiam entre a saudade aristocrática da Monarquia recém sepultada e a apoteose oligárquica de uma República parida à fórceps.
E foram esses brancos, agora “burgueses” que gritavam entre as quatro linhas expressões como “Corner”, “Back” “Penalty” “Dribble” e esse charmoso esporte britânico ia delimitando bem os espaços sociais.
Homens pretos, recém saídos da escravidão e agora convivendo com a adversidade das ruas, dos morros, do adro das igrejas, do chão das fábricas, não eram bem vindos nos clubes onde se praticava o esporte.
Demorou para que um time de Futebol aceitasse um jogador Preto. A Ponte Preta, de Campinas, foi pioneira, e até hoje carrega o apelido de Macaca, sabe – se porquê.
Contam que, em 1914, num jogo entre Fluminense e América, um jogador de pele preta, chamado Carlos Alberto, para se passar como branco, colocara pó de arroz no rosto. Com o suor e o pó se diluindo, a torcida rival percebeu o engodo e, em coro, passou a gritar repetidas vezes: “É Pó de Arroz!”
Batizando assim o Tricolor das Laranjeiras.
Claro que a presença de jogadores Pretos deu alicerce ao Futebol, e são vários os que desfilaram seus talentos pelos gramados. Leônidas inventou a Bicicleta, Didi, a Folha Seca, Garrincha foi o Anjo das Pernas Tortas, Ronaldinho Gaúcho, o Bruxo, Ronaldo, o Fenômeno. Neymar, que recentemente reconheceu – se como Negro, tem assumido papel de militância, importante para quem carrega o status de maior craque brasileiro desta geração, embora ainda não tenha um adjetivo que o qualifique (ao menos que eu saiba). E tem o maior de todos, Edson Arantes, Pelé, o Rei.
Mas o Futebol não se limita ao encanto dos gols, ao espetáculo simbólico das grandes emoções. Ele ingressou no universo do show business, alavanca bilhões em cifras, edifica vidas de poucos e destrói sonhos de muitos enfim, é o Futebol, um dos mais perversos processos seletivos que se tem notícia.
E como lugar comum em nossas vidas, ele também é palco de problemas que afligem a nossa sociedade. Como o Racismo, por exemplo.
Tipicamente masculino, o futebol exalta a virilidade, a boçalidade machista, fálica, onde talento pode ser combatido com xingamento e porrada, tudo em nome da normalidade. Se exceder, puxa a orelha, dá um cartão!
Quem já jogou bola, pegou um baba, ou mesmo se profissionalizou (e esses são poucos), sabe bem o que estou dizendo.
Só que essa normalidade agora está sendo vigiada. O silêncio dos estádios órfãos de torcedores, as câmeras vigilantes e os estudiosos de leitura labial promovem um verdadeiro big brother onde todos são monitorados permanentemente e qualquer deslize ético é logo condenado, de acordo a conveniência do espetáculo, do mercado, da grande mídia.
Em tempos estranhos como o que vivemos, perdemos tempo explicando o óbvio.
Dizer que somos um país racista, por exemplo.
Daquele Maracanã vazio, sobram narrativas, interpretações, acusações recíprocas, redes sociais pautadas e o mais importante, nós, pessoas comuns, debatendo o tema.
De um lado, um Índio colombiano, do outro, um Preto brasileiro. Entre eles, dois clubes de futebol e nós!
Não devemos condenar sem a garantia ao direito de ampla defesa, também devemos respeitar a palavra do agredido e, se houve injúria racial, não há caminho que não seja a punição equivalente.
No que pese ser constrangedor assistir a uma novela cujo enredo traz o Esporte Clube Bahia, que hasteia bandeiras tão nobres, como a do Antirracismo, ter agora o jogador que é a sua maior promessa, no olho desse furacão e o Clube de Regatas do Flamengo que exibe o seu orgulho ferido e cobra rápidas providências da justiça para este caso e se arrasta numa leniência injustificável e desprezível para indenizar as famílias dos meninos mortos no Ninho do Urubu.
Provável que esse caso do Índio Ramirez e do Preto Gerson, fique, como tantos outros, nos arquivos dos casos sem solução. Mas serviu como uma última lição, a que tentei passar para um amigo hoje, quando me perguntou:
– Mas não pode chamar de Negro?
Eu lhe disse:
– NÃO!
– Então o certo é chamar de Preto?
– TAMBÉM NÃO!
Ele então me perguntou confuso:
– Chama como, então?
E eu lhe disse:
– CHAMA PELO NOME!

Fica a Dica!
Feliz Natal e um Ano Novo de mais combate ao Racismo e a todas as formas de Intolerância!

Texto do Professor e Vereador Uberdan Cardoso



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