“O Enem está sob ameaça”, alertam ex-ministros da educação em carta

Seis ex-ministros da Educação assinaram uma carta para alertar que o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), “o mais importante produtor de evidências sobre a educação brasileira”, está sob “ameaça”.

O órgão é o responsável pela realização do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), que seleciona os estudantes de todo o país para as universidades brasileiras.

Segundo os ex-ministros, a permanência da atual gestão do Inep é “insustentável”.

“Nos quase 85 anos de existência jamais vimos na instituição uma crise tão profunda, ainda mais às portas da realização do mais importante instrumento de acesso ao ensino superior, que é o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Quando o Inep é ameaçado, perde-se o efeito de ‘Estado’, nas políticas educacionais, e fica-se apenas em questões superficiais, como as interferências ideológicas opostas ao caráter técnico. Com as evidências é que surgem políticas educacionais para quem importa: os estudantes”, escrevem os ex-ministros Tarso Genro, Fernando Haddad (que comandaram a Educação no governo Lula), Aloizio Mercadante, Renato Janine Ribeiro (governo Dilma), Mendonça Filho e Rossieli Soares (governo Temer).

Às vésperas do exame, o governo passa por uma crise que envolve denúncias de interferência em conteúdo e assédio moral de servidores.

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já afirmou com todas as letras que pretende deixar o Enem com “a cara do governo” e chegou a pedir ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, para que houvesse questões que tratassem o golpe militar de 1964 como uma revolução.

A crise no Inep explodiu em 8 de novembro, quando servidores entregaram seus cargos no instituto, citando “fragilidade técnica e administrativa da atual gestão máxima do Inep”.

Parte desses funcionários estava diretamente envolvida na organização das provas, que serão aplicadas neste domingo (21) e em 28 de novembro. O principal departamento atingido é a Diretoria de Gestão e Planejamento —responsável, entre outras coisas, por questões logísticas dos exames.

Na carta, os ex-ministros afirmam que “para o bem da sociedade brasileira, o Inep precisa não só ser preservado e fortalecido, mas também obter sua autonomia e independência técnica em relação ao Governo Federal. E a maior prova é o momento de ataque que a instituição passa no momento.

Qualquer interferência sobre as decisões de ordem técnica relativas às ações institucionais do Inep tem potencial de afetar milhões de cidadãos brasileiros e a atuação de gestores educacionais das esferas pública e privada, além de macular a própria reputação da autarquia”.

Eles dizem ainda lamentar “tomar conhecimento de relatos de assédio e interferência política veiculados na mídia, decorrentes da atuação do quinto presidente do Instituto nos últimos três anos e sua equipe”.

E seguem: “A crise institucional do Inep parece ter se tornado insustentável ao nos depararmos com 37 servidores pedindo desligamento de cargos ocupados na gestão operacional de ações estratégicas do Instituto. A resposta do Governo Federal causa estranheza, pois alega-se motivação financeira, sindical e ideológica”.

“Independentemente das apurações dos casos graves, entendemos como insustentável a permanência de uma gestão que levou o clima institucional a esse ponto, e que coloca os servidores como os responsáveis pela crise atualmente configurada. Nessa perspectiva, manifestamos nosso apoio ao qualificado quadro de servidores efetivos do Inep”, dizem ainda os ex-ministros.

Leia a íntegra da carta:

“A grave crise do Inep

O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), o mais importante produtor de evidências sobre a educação brasileira, está sob ameaça.

Nos quase 85 anos de existência jamais vimos na instituição uma crise tão profunda, ainda mais às portas da realização do mais importante instrumento de acesso ao ensino superior, que é o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

Quando o Inep é ameaçado, perde-se o efeito de “Estado”, nas políticas educacionais, e fica-se apenas em questões superficiais, como as interferências ideológicas opostas ao caráter técnico. Com as evidências é que surgem políticas educacionais para quem importa: os estudantes.

O Inep consolidou-se como uma instituição respeitada nacional e internacionalmente, com uma reputação construída em decorrência da qualidade e confiabilidade das informações educacionais que produz, sistematiza e publiciza, ao longo da sua história. É uma Autarquia que exerce funções próprias de órgãos de Estado.

Para o bem da sociedade brasileira, o Inep precisa não só ser preservado e fortalecido, mas também obter sua autonomia e independência técnica em relação ao Governo Federal. E a maior prova é o momento de ataque que a instituição passa no momento.

Qualquer interferência sobre as decisões de ordem técnica relativas às ações institucionais do Inep tem potencial de afetar milhões de cidadãos brasileiros e a atuação de gestores educacionais das esferas pública e privada, além de macular a própria reputação da Autarquia.

Lamentamos tomar conhecimento de relatos de assédio e interferência política veiculados na mídia, decorrentes da atuação do quinto presidente do Instituto nos últimos três anos e sua equipe.

A crise institucional do Inep parece ter se tornado insustentável ao nos depararmos com 37 servidores pedindo desligamento de cargos ocupados na gestão operacional de ações estratégicas do Instituto. A resposta do Governo Federal causa estranheza, pois alega-se motivação financeira, sindical e ideológica.

Independentemente das apurações dos casos graves, entendemos como insustentável a permanência de uma gestão que levou o clima institucional a esse ponto, e que coloca os servidores como os responsáveis pela crise atualmente configurada. Nessa perspectiva, manifestamos nosso apoio ao qualificado quadro de servidores efetivos do Inep.

Diante do exposto, defendemos a adoção de medidas definitivas e estruturantes para solucionar os problemas crônicos enfrentados pela Autarquia nesta gestão e a grave crise do momento atual.”

Carta assinada pelos ex-ministros da Educação (em ordem cronológica)

Tarso Genro
Fernando Haddad
Aloizio Mercadante
Renato Janine Ribeiro
Mendonça Filho
Rossieli Soares

 

Folha de S. Paulo



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