“Não denunciei, pois me sentia responsável pelo estupro”, diz funcionária pública

cê já sofreu violência sexual? A cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. Acontece com celebridades e anônimas, em todas as classes sociais, em casa, na rua, numa festa e até no trabalho. Há casos em que a vítima está consciente, outros em que não. Para chamar a atenção para essa dolorosa –  e tão frequente realidade – publicaremos um relato de estupro por dia.

Aos 26 anos, eu namorava e estava muito apaixonada. Estávamos juntos há 4 anos, quando soube de outras pessoas que ele tinha me traído. Isso me machucou demais. Eu não conseguia conviver com aquilo e ao mesmo tempo não aceitava perdê-lo. Nos afastamos. Imaginei que, saindo com outra pessoa, me sentiria melhor e seria capaz de perdoá-lo.

Resolvi então aceitar um convite para um drink de um colega de trabalho. Ele devia ter mais de 40 anos, era bonito e muito inteligente. Mesmo quando eu namorava, ele já dava indiretas de que estava interessado em mim.

Você já sofreu violência sexual? Envie seu relato

Eu ainda estava muito mal por conta da traição e senti que sair com ele era uma forma de levantar a minha autoestima. Eu não estava apaixonada por ele, só queria dar uns beijinhos para aliviar a raiva que sentia do meu ex.

Chegamos ao restaurante e lá ele me disse que tinha deixado de ir ao aniversário de uma amiga só para me encontrar, mas que se eu topasse poderíamos ir à festa e cumprimentá-la. Aceitei e fomos no carro dele.

Após dirigir por algum tempo, chegamos em um lugar deserto à beira de um lago. Eu estranhei, perguntei onde estávamos, onde era a festa. Até então eu não sentia medo, eu o conhecia, ele sempre era muito gentil, não passava pela minha cabeça que pudesse me fazer mal. Ele disse que tinha parado um pouquinho, pois queria ficar sozinho comigo. Imaginei que quisesse dar uns ‘amassos’, mas sequer tinhamos nos beijado ainda.

Só que assim que estacionou, ele já começou a ser violento comigo, me agarrou com força e me puxou para fora do carro. Fiquei assustada com o jeito agressivo e desrespeitoso. Passei a dizer que não queria, a pedir que me soltasse. Ele ignorou o que eu falava e começou a tirar a minha roupa e rasgou a minha calcinha.

Logo em seguida, ele puxou com muita força o meu cabelo e me forçou a ficar de joelhos, enquanto me ameaçava. Me fez repetir que eu queria aquilo, que eu estava gostando. Ele falava como um drogado, com os olhos injetados. Comecei a chorar.

A situação tinha saído completamente do controle. Passei a obedecer suas exigências para não ser mais agredida. Estávamos em um lugar isolado, que só aumentava o meu medo. Eu sabia que ali não poderia pedir ajuda a ninguém. Ele me jogou com violência no chão e me estuprou. Quando acabou, puxou o meu cabelo novamente e ainda perguntou se eu tinha gostado.

Ele então se levantou como se nada de anormal tivesse acontecido, me colocou no carro e me deixou no restaurante onde estávamos antes. Eu estava completamente passada. Não conseguia acreditar naquilo tudo.

Passei a conviver com uma vergonha imensa e com um enorme pânico de reencontrá-lo. Tinha pavor da ideia de que ele pudesse ter contado a alguém. E o pior, que isso chegasse ao conhecimento do meu ex-namorado, que eu ainda amava.

Não denunciei, nem contei a ninguém por muito tempo. Eu estava muito envergonhada, me sentia em parte responsável pelo estupro. Na minha mente, eu tinha facilitado aquela circunstância, eu tinha dado chance de aquilo acontecer. Quando contei tudo às minhas amigas, a primeira pergunta foi: “Por que você saiu com ele?” – a resposta era “porque eu quis”, mas isso não justifica. Eu quis sair com ele, mas não achei que seria violentada, ninguém deseja isso.

Esse homem fez eu me sentir um lixo. Além de ter sido violada, vivi dias de agonia, com medo de alguém descobrir. Me senti culpada demais pelo que tinha passado. Hoje, 25 depois, sei que a culpa foi inteiramente dele e que o mesmo pensamento atrasado que me inibiu de denunciar esse crime ainda existe. São machistas que acham que o fato de uma garota topar sair com eles já é um sinal verde para fazerem o que quisessem com ela. Eu ainda odeio o meu agressor e quero que ele morra, assim como desejo o pior para todos os estupradores. São monstros que não tem qualquer respeito pelas mulheres, que sequer gostam de mulheres.”

(Revista Marieclaire)



Veja mais notícias no blogdovalente.com.br e siga o Blog no Google Notícia