Modelo baiana estampa capa de revista internacional com ‘dreadlocks’: ‘Meu símbolo de resistência’

Aos 22 anos, a modelo baiana Samile Bermannelli estampa, neste mês, a capa da edição de aniversário de uma grande revista internacional. Com dreadlocks como símbolo de resistência, ela conversou com o G1 e falou sobre a mensagem que tenta levar aos jovens negros.

Como muitas crianças pretas, Samile também passou pelo processo de alisamento capilar para tentar se sentir parte de uma sociedade que não enxerga beleza nos traços negros. Tudo mudou no final da adolescência, quando ela precisou assumir os cabelos ao natural, por causa da carreira.

“Eu comecei a alisar meu cabelo por volta dos 9 anos de idade. Eu queria poder deixar os meus cabelos soltos, só que os fios crespos não eram bem aceitos pela sociedade. Então eu fiquei refém do relaxante químico por oito anos, até que, após um ano e meio na minha carreira de modelo, minhas agências decidiram cortar o meu cabelo”.

A modelo então passou por um processo muito conhecido por pessoas crespas e cacheadas, quando resolvem assumir a textura natural de seus cabelos: o big chop. O termo significa basicamente um grande corte, definitivo. Quando a pessoa corta toda a parte do cabelo que recebeu química.

Modelo baiana estampa capa de revista internacional — Foto: Reprodução/Redes Sociais

Durante a transição capilar, período em que se espera o crescimento do cabelo, antes do corte, pessoas crespas e cacheadas vivem um dilema: a ansiedade causada pela demora. As duas texturas – alisada e natural – também acabam sendo um obstáculo. Samile conta como lidou com a situação.

“O período de transição foi bem desafiador. Foi a parte mais complicada, esperar ele crescer um pouco para fazer o big chop. Foram cinco meses nessa transição. Eu dormia de coquinhos quase todas as noites, para no dia seguinte soltar os cachos e poder sair. Muitas meninas optam por não fazer o big chop e passar por toda a transição fazendo cachos com baby liss todos os dias”.

“Vivia com medo da chuva, que podia acabar com a texturização. Não é um processo simples, mas vale a pena e é libertador”, Samile Bermannelli. Com as duas texturas da transição, vem o abalo na autoestima – mesmo em uma modelo. Samile lembra como se sentiu no momento em que enfrentou o big chop. Apesar disso, ela nunca pensou em desistir da transição.
“A primeira coisa que eu pensei foi: ‘Meu Deus! Será que vou continuar sendo atraente com cabelo tipo Joãozinho?’ E: ‘Será que as pessoas vão se interessar por mim?’ Porque, por conta do big chop, ele ficou super curtinho e foi bem complicado. Mas eu sabia que poderia ser bom para a minha carreira”. “Nunca pensei em desistir da transição capilar, mas tinha épocas em que eu pensava: ‘Meu Deus, ajuda esse cabelo a crescer logo’. Minha autoestima foi lá no chão, mas após alguns meses eu renasci”.

E o reconhecimento por assumir o natural veio a galope. Se antes o cabelo alisado era, por vezes, um incômodo, depois do corte tudo mudou.

“No início da minha carreira, meu cabelo era quase um probleminha, porque ele estava completamente destruído por conta da química. Eu tentei mega hair por quase um ano. Depois, decidimos cortar, porque os cabelos que a gente tinha tentado não funcionaram muito bem. Quando eu fiz o big chop, tudo mudou. Eu passei a ser chamada para editoriais de revistas, campanhas, e rapidinho a minha agência–mãe conseguiu fechar contratos com agências internacionais”, conta.

“Seis meses com o cabelo cortado e natural, eu já saí do país para fazer a minha primeira viagem internacional. Desde então eu venho tentando mostrar para marcas e clientes opções de cabelos afrocentrados”.

Agora, na capa da Issue Magazine, Samile segue construindo e aflorando a carreira, enquanto ajuda a construir uma indústria mais inclusiva, para que outras mulheres e modelos negras também possam assumir suas raízes afro.

“Eu fico sem palavras, até porque nem nos meus melhores sonhos eu imaginei isso. Essa capa, para mim, é meu símbolo de resistência e insistência, de que o céu é o limite e que nós, pessoas pretas, podemos ser e fazer o que a gente quiser”.

O empoderamento se estende também para as redes sociais da baiana, que criou uma rede de apoio com outros jovens negros que se sentem representado por sua negritude.

“Eu fico muito feliz de poder compartilhar questões do meu dia a dia, e elas se tornarem inspiração para as outras pessoas. Esse diálogo que eu tenho com os meus seguidores é uma conversa que tem se construído tipo uma rede de apoio”, avalia ela.

“Eu me sinto forte com o apoio deles, e eu quero que eles se sintam fortes e grandes da mesma forma com essa troca linda que nós temos. É para mostrar para esse jovens que, se eu cheguei até aqui, é porque é possível”.

Fonte: G1



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