Bahia tem 7 pessoas desaparecidas por dia em 2022

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Entre o dia 01 de janeiro e 31 de julho desse ano, 1.511 pessoas desapareceram na Bahia, uma média de 7,1 casos por dia, segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP).

Os sete meses de 2022 já quase superam o total registrado em todo ano de 2021, que teve 1.519 desaparecimentos e um média 4,1 pessoas/dia. A média de sumiços deste ano é maior também do que o registrado em 2020 (4.0/dia) e 2019 (5.0/dia).

“Já procurei no IML (Instituto Médio Legal) e em vários locais de desova, mas até agora não encontrei. Estou desesperada”, desabafa a dona de casa Celidalva Conceição Xavier, 48, mãe de Pedro Henrique Conceição, 26, desaparecido desde 30 de junho, em São Cristóvão, após ter sido abordado por três homens, supostamente policiais.

Em Salvador, segundo dados da Polícia Civil, foram 205 desaparecimentos no primeiro semestre de 2022, dos quais 166 pessoas foram localizadas: 155 com vida e 11, os corpos. Do total dos desaparecidos na capital este ano, 145 são homens e 60, mulheres; 134 têm entre 18 e 60 anos e 79 tinham problemas psicológicos, transtornos mentais ou enfrentavam conflitos familiares, os três motivos mais recorrentes para os sumiços. No recorte por raça, foram 183 pardos, 15 pretos e sete brancos. No ano passado, das 340 pessoas desaparecidas na cidade, 296 foram achadas.

“A nossa família está sofrendo demais. Eu estou sem comer, sem dormir, vivendo à base de remédios. A minha neta de 1 ano  e 8 meses fica o dia inteiro beijando a foto do pai. Precisamos de respostas”, afirma dona Celidalva.

Pedro Henrique desapareceu na Rua Santo Antônio, depois de deixar o restaurante da irmã. Na volta para casa, ele foi abordado por três homens que estavam em um Ford Ka preto. Os dados obtidos pela reportagem com a SSP não apontam a causa do sumiço, mas, para Celina, os sequestradores são policiais militares.

“Eles são acostumados a fazer isso, sumir com os moradores daqui. Um filho de uma vizinha foi pego por eles aqui na rua e solto no dia seguinte na Estrada do CIA. Eles (sequestradores do vizinho) estavam no mesmo carro usando para levar o meu filho”, denuncia Celidalva.

De acordo com ela, Pedro Henrique cumpriu pena de um ano e oito meses por tráfico de drogas. “Meu filho foi preso em 2018 e agora trabalha alugando som para festas.  Eles (policiais) sempre passaram por aqui, mas nunca fizeram nada. Inclusive, um dia antes do sumiço de Pedro, eles viram meu filho sentado na porta de casa e não abordaram. Eu tenho fé em Deus que vou encontrá-lo vivo. Venho orando dia e noite ”, diz Celidalva, que é evangélica e já registrou o desaparecimento do filho no Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP) e na Corregedoria da Polícia Militar.

À reportagem, a Polícia Civil disse, em nota, que o caso do sumiço de Pedro em São Cristóvão “está sendo investigado pela Corregedoria da Polícia Militar (PM). Procurada, a Corregedoria não respondeu até o fechamento desta edição, às 23h.

Cartilha

Para provocar a sociedade civil a se manifestar sobre os desaparecimentos, principalmente em decorrência de abordagem policial, a Defensoria Pública do Estado (DPE/BA) lança nesta sexta-feira (26), a cartilha Alguém Desapareceu: e Agora?. “Queremos prestar esclarecimentos e, principalmente, oferecer um caminho mais simples à população vulnerabilizada que passa por essa situação”, explica a defensora pública Lívia Almeida, coordenadora da Especializada de Proteção aos Direitos Humanos da DPE/BA.

A cartilha traz o conceito de desaparecimento: o sumiço repentino de alguém, sem aviso prévio a familiares ou a terceiros.  Uma pessoa é considerada desaparecida quando não é localizada nos lugares que costuma frequentar, nem encontrada de qualquer outra forma. Várias razões podem ocasionar o sumiço de alguém, a exemplo de conflitos familiares, uso de drogas e outras substâncias que causam dependência, transtorno mental, depressão e violência, entre outras.

“O perfil das pessoas desaparecidas tem algo em comum, segundo dados estatísticos nacionais: a cor da pele. Significa mais uma demonstração do racismo [estrutural] na nossa sociedade. São pessoas consideradas descartáveis. Na nossa cartilha tem uma informação muito importante para toda a sociedade, não há necessidade de esperar 24h para registrar o desaparecimento. Quantas mães já foram impedidas de registrar um desaparecimento com base nesse argumento?”acrescenta Lívia Almeida.

A cartilha traz três tipos de desaparecimentos. No voluntário, a pessoa se afasta por vontade própria; no involuntário, ela é afastada do cotidiano por um evento sobre o qual não tem controle, como um acidente, um problema de saúde, um desastre natural; e o forçado, que ocorre quando outras pessoas provocam o afastamento, como em um sequestro, ou diante de uma ação do próprio Estado.

O documento contém ainda informações de como agir em caso de desaparecimento, destacando os que ocorrem após abordagem policial.  A cartilha está disponível nas versões impressa e digital, para download, no site da DPE.

Sumiços forçados 

Um dos casos de sumiço forçado que ganhou repercussão nacional foi a morte de Geovane Mascarenhas, 22 anos, decapitado dentro da base da Rondas Especiais (Rondesp) da Polícia Militar, no Lobato, em 2014. A morte dele tornou-se pública após o Correio ter tido acesso, com exclusividade, às imagens da abordagem de três policiais militares à vítima, no dia 02 de agosto de 2014, na Calçada, última vez em que ele foi visto com vida.

Geovane teve os órgãos genitais, as mãos e as tatuagens arrancados para dificultar sua identificação. Seus restos mortais foram cobertos com plástico, carbonizados e deixados em dois pontos distintos de Salvador. Sete policiais militares vão à júri popular pelo crime. Denúncia recente do CORREIO mostrou que cinco deles estão trabalhando nas ruas.

Um outro caso que chamou à atenção da população foi o desaparecimento de Davi Fiuza, 16 anos, em outubro de 2014. Na ocasião, o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), apontou que, 19, dos 23 PMs indiciados pelo caso, eram alunos do curso de formação da PM.

Eles faziam uma operação final para obtenção do diploma de soldado, quando, segundo o inquérito, abordaram o garoto na Rua São Jorge e o raptaram. O inquérito aponta que os alunos eram supervisionados por quatro PMs da 49ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM/São Cristóvão), com patentes de tenente, sargento e cabo. Davi até hoje segue desaparecido.

Sem Descanso

A cartilha da DPE será distribuída gratuitamente na tarde desta sexta-feira (26), na exibição do documentário Sem Descanso, dirigido por Bernard Attal. O filme faz parte da programação do Cine Debate da Defensoria Pública da Bahia e conta a história de Geovane Mascarenhas, um jovem de 22 anos, de um bairro pobre de Salvador, que desapareceu após uma abordagem da Polícia Militar, há oito anos. O pai de Geovane não descansou até encontrar o paradeiro do filho, que foi brutalmente assassinado pelos PMs.

A produção reflete sobre um grave problema social: dados comprovam que a polícia brasileira é a mais violenta do mundo, deixando vítimas que são, principalmente, jovens negros. Para debater sobre as raízes históricas e sociais da brutalidade policial estarão presentes no evento, além do diretor do filme, o repórter do CORREIO Bruno Wendel, responsável pela série de reportagens que inspirou a realização do documentário; e familiares de pessoas desaparecidas após abordagem policial, como Jurandy Silva, o pai de Geovane Mascarenhas; Camila Fiuza, irmã de Davi Fiuza, e Wagner Campos, coordenador do grupo Ideas.

A mediação do debate será da defensora Lívia Almeida, coordenadora da especializada de Direitos Humanos da Defensoria da Bahia. “Esse é um problema que deve ser enfrentado como prioridade por todos os órgãos envolvidos na segurança pública, principalmente a própria SSP.

A Defensoria está buscando fazer sua parte, indicando seus canais de atendimento para receber as denúncias da população e fazer a imediata articulação com a SSP para encontrar a pessoa. Isto porque, após uma abordagem policial e respectiva apreensão da pessoa, o cidadão deve ser apresentado a uma delegacia. Se isso não ocorrer, há uma grave ilegalidade que deve ser combatida”, diz Lívia.

A exibição de Sem Descanso acontece das 14h às 18h, na sala de Cinema do MAM [Museu de Arte Moderna] no Solar do Unhão, localizada na Avenida Contorno. É obrigatório o uso de máscaras e a apresentação de cartão de vacinação com pelo menos duas doses aplicadas. A entrada para o evento é gratuita.

Telefones Úteis em caso de desaparecimento

Disque Defensoria
Telefones: 129 ou 0800 071 3121 (de segunda a quintafeira, das 8 às 17h, e sexta-feira, das 8 às 14h

Plantão de urgência da DPE nos finais de semana e feriados
Das 8h às 18h Capital – Telefone: (71) 99913-9108
E-mail: [email protected]
Interior – Telefone: (71) 99650-1669
E-mail: [email protected]

Casa da Defensoria de Direitos Humanos
Endereço: Rua Arquimedes Gonçalves, nº 482 – Jardim Baiano, Salvador – BA Funcionamento: segunda a quinta-feira, das 8 às 17h, e sexta-feira, das 8 às 14h

Disque Denúncia
Telefones: 181 (capital e interior do Estado / ligação gratuita) Site: http://disquedenuncia.com/desaparecidos/

Programa de Localização e Identificação de Desaparecidos do Ministério Público da Bahia (PLID/MPBA)
Endereço: Sede Principal – 5ª Avenida, n° 750, sala 131, Centro Administrativo da Bahia, Salvador/BA CEP: 41.745-004 Site: https://desaparecidos.mpba.mp.br E-mail: [email protected]

Central de Flagrantes
Endereço: Av. Tancredo Neves, 4197 – Parque Bela Vista, Salvador – BA, CEP: 41100-800 Telefones: (71) 3116-4699

Polinter
Endereço: Av. Vale dos Barris, s/n – Politeama, Salvador – BA, CEP: 40070-055
Telefones: (71) 3116-6572

*Correio

 

 

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