Confiança no filho adolescente deve começar a ser construída na infância

Não é fácil dominar o medo e permitir que o adolescente caminhe com as próprias pernas. A necessidade de afastar o filho dos perigos do mundo pode levar alguns pais a agirem de maneira paranoica, desestimulando sua autonomia. Mas como saber se o filho merece confiança?

Segundo a psicóloga Vera Zimmermann, coordenadora do Cria (Centro de Referência de Infância e Adolescência) da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), a construção da confiança se dá desde a infância. “Os pais têm duas funções primordiais, dar o sentimento de pertinência para a criança, mostrando que ela é aceita pela família, e, ao mesmo tempo, desenvolver sua autonomia, para que possa caminhar sozinha”, declara.

Para Vera, embora a proteção seja necessária, tanto na infância quanto na adolescência, não deve se sobrepor ao exercício da independência. “O ideal é combinar o cuidado com oportunidades para que o filho se desenvolva de maneira gradativa e supervisionada. Por exemplo, pode-se permitir que ele vá a uma festa, mas com horário certo para voltar e com a combinação de ligar, caso algo aconteça”, afirma.

De acordo com a especialista, um dos erros mais comuns que os pais cometem é enviar mensagens desestimulantes, que passam para o filho a ideia de que ele estará por conta própria se algo der errado em sua iniciativa. “Isso acontece quando dizem que a criança pode até ir brincar na casa do amigo, mas, se cair, que não venha chorar. Pai e mãe precisam dizer o contrário. Vá, tome cuidado e, se precisar, chame que estaremos aqui.”

Segundo Marilda Novaes Lipp, psicóloga cognitivo-comportamental e autora do livro “O Adolescente e seus Dilemas” (editora Papirus), o jovem necessita de espaço emocional para experimentar e aprender a lidar com os desafios do mundo dos adultos. “O equilíbrio entre impor limites e dar liberdade sempre foi um dilema entre pais e filhos. É preciso estabelecer regras claras de conduta e ficar atento para proteger os filhos de situações perigosas, como uso de drogas, dirigir embriagado ou cair na promiscuidade sexual”, diz.

A psicóloga diz que os pais devem tomar cuidado para não entrarem em uma jornada de paranoia, desconfiando e vigiando demais, principalmente quando não há motivos para isso. “Uma fiscalização intensa e persecutória só leva o jovem à rebeldia. Confiar no filho é essencial, com cautela. O ideal é manter o diálogo aberto desde a infância, assim, quando ele chegar à adolescência, não haverá necessidade de vigiar.”

Outra atitude que deve ser evitada pelos pais é o hábito de nunca dar razão ao filho. “Pais devem validar a opinião dos filhos, mesmo que não concordem com ela e jamais devem duvidar do sucesso e da capacidade deles. Devem, ao contrário, encorajá-los, guiá-los, apoiá-los, mostrando que acreditam em sua capacidade de vencer na vida”, fala Marilda.

Para ela, quando o diálogo é cultivado desde cedo, os filhos tornam-se aliados dos pais, pois sabem que receberão apoio em situações difíceis. “Recomendo, entretanto, que fiquem atentos às companhias, pois, como a adolescência é o período em que os jovens testam os valores, pode ocorrer de adotarem, mesmo que temporariamente, o comportamento dos amigos.”

Na opinião de Vera, pais invasivos demonstram que não construíram com tranquilidade a relação de confiança com os filhos. “Sentem que falharam em seu trabalho como pais e ficam sempre pensando que vai acontecer uma desgraça.” Outra possibilidade é projetarem nos filhos a própria experiência, mas o resultado da vigilância excessiva pode ser bastante nocivo. “Se existe muita invasão, a tendência é fazer escondido”, diz Vera Zimmermann.

Situações extremas, entretanto, exigem intervenção do adulto responsável. Mesmo que isso signifique vasculhar a mochila, o celular ou vigiar de perto. Isso acontece quando o vínculo de confiança já foi quebrado e o adolescente dá sinais de que algo não está bem, mudando de comportamento. “Há momentos em que a experimentação excede o limite e é preciso que um adulto entre em cena e contenha”, declara.

Para Marilda, em algumas situações, é melhor fiscalizar do que ser negligente. “Conheço casos em que o adolescente se enfurecia com a vigilância porque estava usando drogas e não queria que os pais descobrissem. Apesar da revolta do jovem, isso possibilitou que ele recebesse ajuda.”

*Uol



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